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    REVIEW – Skate Story é um jogo imperdível para quem entende que videogame é uma forma de arte

    Um skatista de vidro perdeu sua liberdade ao assinar um contrato com o Diabo e agora precisa enfrentar uma jornada pelo Submundo rumo à Lua para devorá-la e, assim, voltar a ser livre. Essa é a surreal proposta de Skate Story, primeiro jogo desenvolvido por Sam Eng, lançado em 8 de dezembro pela Devolver Digital para PC, Nintendo Switch 2 e PlayStation 5, também disponível gratuitamente para assinantes do serviço PlayStation Plus Extra.

    Esta análise reflete minha experiência com o jogo para Nintendo Switch 2.

    A gameplay traz o skate de rua ao Submundo para uma jornada que mistura filosofia, literatura e crítica social. Tudo isso embalado com um visual que reflete tanto quanto uma bola de discoteca, numa estética surrealista cheia de flashes e quebra-quebra toda vez que o personagem cai ou se choca contra alguma estrutura.

    O aviso sobre cuidados para quem tem epilepsia ou algum problema que possa ser agravado por conta de luzes piscantes está presente logo ao iniciar o jogo, também indicando que é importante fazer pausas após sessões de uma hora mesmo se esse não for o seu caso.

    Para ajudar a saber o momento ideal para descansar, Skate Story possui um contador de horas da sua sessão e também do quanto você jogou num geral, sendo de grande ajuda para saber quando parar.

    Esse tipo de alerta está presente em diversos jogos, na verdade. É até incomum destacar isso num review, mas trago aqui já no início porque faz muito sentido para Skate Story realmente respeitar esses momentos de pausa, pois há um grande contraste de cores no Submundo e, principalmente, uma gameplay cheia de luzes piscantes a todo momento.

    Se você enfrenta alguma dificuldade por conta de luzes piscantes, certamente esse jogo não é para você. Mas, se não for o caso, vá numa boa respeitando os momentos de descanso. Eu não lido com questões de saúde como as mencionadas, mas mesmo assim minha visão realmente cansou se eu prolongava as sessões para além de uma hora, especialmente no modo portátil do Nintendo Switch 2 por conta da tela menor que a da TV, mas com cores super vivas.

    Em paralelo ao válido alerta, não há como não exaltar o estilo artístico surrealista, psicodélico, abstrato… único! Skate Story chama atenção pelo visual contrastante e sua proposta brilhante de ter um skatista de vidro reluzindo pelos cenários bizarros do Submundo, muitos deles inspirados nas ruas de Nova Iorque, cidade onde vive o desenvolvedor Sam Eng e que possui uma cultura forte de street skate.

    As escolhas criativas por vezes são abstratas, mas jamais aleatórias. Tal qual uma pintura, por exemplo, o jogo está cheio de elementos que serão livremente interpretados por quem joga. Certamente há a real intenção de Sam Eng por trás de cada linha do seu roteiro, mas é também um trabalho aberto para que cada pessoa perceba Skate Story da sua própria maneira.

    Sim, Skate Story é uma forma de arte. E se você considera que videogames podem ser tão valiosos como obras de arte que emocionam, provocam, convidam a refletir… bem, pode ter certeza que esse é um jogo que você precisa experienciar e tirar suas próprias conclusões dessa proposta surrealista.

    E por falar em formas de arte, o jogo conta com trilha sonora original de Blood Cultures, coletivo independente de Nova Jersey composto por membros anônimos e que produzem músicas nos gêneros experimental, pop psicodélico e chillwave. As composições originais para o jogo são incríveis e combinam muito bem com toda a proposta, outro fator que diferencia esse título de outros do gênero com foco no esporte tradicional.

    Outro elemento criativo que vale destacar é a moeda do jogo, chamada alma. Essa escolha não é por acaso, e parte do enredo ironiza o fato de que o dinheiro da vida real é conquistado pela maioria das pessoas em troca do seu tempo de vida. Conquistá-lo pode ser perda de tempo e, por consequência, perda de alma. Gastá-lo também pode ser, especialmente por um viés puramente consumista.

    Essa é uma boa crítica social que está presente também em outros contextos do jogo, como um ambiente focado em lamentações. Mas, como destaquei antes, o game é provocativo e um convite à livre interpretação, de modo que encerro por aqui os detalhes para que você possa refletir e tirar suas próprias conclusões sobre os aspectos filosóficos e literários dessa experiência.

    Arrependimento do Tempo (Regret of Time) é uma das interações provocativas presentes em Skate Story, jogo desenvolvido por Sam Eng e publicado pela Devolver Digital
    Arrependimento do tempo, uma das provocações presentes em Skate Story | Créditos: Emerald Corp

    Skate de rua como você nunca viu

    É fato que Skate Story é mais simples para quem está acostumado a jogar títulos como os da série de Tony Hawk (que é o meu caso). No entanto, o tutorial é bem didático e novas manobras são ensinadas gradualmente até a reta final do jogo, sempre com uma aplicação prática que te ajuda a memorizar os comandos, que em geral são bem simples.

    As manobras são simplificadas, de modo que você aperta A para pular e mais algum outro botão para fazer um flip ou um pop, ou então girar o joystick para fazer alguma manobra de giro. Entre as manobras básicas há também o manual, o nose manual e, claro, os grinds.

    É interessante notar que Sam Eng escolheu uma abordagem mais realista para os grinds, que pode ser a principal pedra no caminho de quem não está acostumado com um jogo de skate. Digo isso porque aqui você realmente precisa acertar a posição do skate para deslizar por uma corrimão ou alguma outra superfície adequada, o que difere da proposta dos jogos de Tony Hawk em que você tem um botão que funciona como um “imã” para que você acerte o grind.

    As manobras sozinhas rendem poucos pontos e se você as repete muito, começam a dar menos pontos, o que é comum nos campeonatos e nos jogos de skate. No contexto do game, a desvalorização dos pontos significa que os movimentos se tornam entediantes aos olhos do Filósofo.

    Essa pontuação serve para você apertar X quando estiver prestes a aterrissar para concluir o combo, servindo como um golpe cujo dano ao inimigo é o total de pontos obtidos. Esse é um plot twist maravilhoso e que torna a gameplay de Skate Story algo único no gênero.

    Mais para o fim do jogo são ensinados movimentos avançados cujo objetivo é apertar os botões L, R, ZL ou ZR antes do A para pular, a fim de que as manobras sejam um pouco mais desafiadoras e, por isso, rendam mais pontos. Embora sejam avançadas, o fato de que você pode pressionar os botões antes de pular torna a experiência mais simples do que estamos acostumados a ver em games de skate.

    O jogo de estreia do desenvolvedor solo Sam Eng entrega tutoriais criativas e didáticos para ensinar a andar de skate nesta jornada pelo Submundo
    Tutoriais criativos e didáticos em Skate Story | Créditos: Emerald Corp

    Os adversários são criaturas únicas inspiradas em elementos conhecidos de outros jogos ou da própria natureza. Há por exemplo inimigos que lembram as sentinelas de The Legend of Zelda: Breath of the Wild, ao mesmo tempo em que há NPCs inspirados em centopéias, inclusive um trem que eventualmente precisamos pegar.

    Outro aspecto bem interessante de Skate Story são as boas opções de acessibilidade, que podem facilitar ou dificultar a experiência sem ser uma simples escolha de nível de dificuldade. Por exemplo, é possível aumentar ou reduzir o tempo de validade do combo e a quantidade de pontos perdidos a cada segundo após parar de fazer manobras.

    Problemas técnicos evidenciam o quão desafiador foi fazer esse jogo

    Skate Story foi anunciado em 9 de junho de 2022 e, desde então, eu acompanho o desenvolvimento. A proposta inicial era desenvolvê-lo para PC, depois foi anunciado para PlayStation 5 e, por conta do poder de hardware do novo console lançado pela Nintendo em 2025, nesse ano mesmo foi informado que também chegaria para o Nintendo Switch 2.

    Inegavelmente é um jogo que chamou atenção pelos visuais e pela proposta diferenciada envolvendo skateboard. Possivelmente, cada aparição fez o projeto ganhar corpo e pegar embalo para chegar a mais plataformas. Isso significa aumentar também o tempo de desenvolvimento, polimento e controle de qualidade para a realidade de cada versão.

    Interpreto esses desafios até mesmo como um motivo para o uso da metalinguagem em um momento específico em Skate Story. Há uma parte em que você joga como se estivesse dentro do software de desenvolvimento Unity, com as abas todas organizadas como se o programa estivesse aberto, simulando a experiência de usar essa engine para desenvolver e testar o projeto.

    Então é fundamental levar em consideração todo o contexto com o qual um único desenvolvedor precisou lidar. Por isso, destaco aqui que o resultado é fenomenal em termos de criatividade e técnica considerando tudo isso, mesmo que existam alguns problemas.

    A questão mais grave, mas de fácil resolução durante a gameplay, diz respeito à transição entre TV e modo portátil do Nintendo Switch 2. Por alguma razão o jogo por vezes fica travado, quase em câmera lenta. A jogabilidade fica bem prejudicada, mas felizmente basta reiniciar o game para que volte ao normal. Os salvamentos são frequentes, então é difícil que você tenha algum prejuízo, mas acaba truncando um pouco a experiência se você costuma alternar a maneira de jogar.

    A performance num geral é consistente, mas por vezes essa queda de quadros por segundo (frames per second – FPS) acontece também mesmo sem mudar da TV para o portátil, o que também deixa a visão mais cansada.

    Outros problemas que experienciei começaram a acontecer a partir da missão de lavar roupas do Diabo. Desse momento em diante alguns textos não estavam traduzidos para português, o que é um problema para quem não entende inglês.

    Em determinado momento você pode jogar Skate Story como se estivesse na janela da engine Unity, software utilizado para desenvolver games
    A metalinguagem é um recurso muito bem utilizado em Skate Story | Créditos: Emerald Corp

    Nessa parte também foi onde começou a dar um bug sempre que tentava deslizar em superfícies avermelhadas, fazendo com que o personagem caísse “pra dentro” do chão, rumo ao nada. Não chega a ser um problema porque o skatista simplesmente retorna como se tivesse se quebrado ao cair muito, mas gera certa frustração.

    Um outro bug bizarro que aconteceu comigo foi no capítulo 4, quando estava na loja para customizar meu skate e o personagem foi teletransportado para uma área que deveria ser inacessível, fora da estrutura física da loja, sem poder retornar. Felizmente o jogo oferece o recurso ejetar para o Sonho do Skatista no menu de pause, que é como se fosse um pequeno lobby para eventualmente pegar alguma coisa ou relembrar as manobras desbloqueadas, então não tive prejuízos nem fiquei preso.

    Veredito

    Skate Story é um jogo indie único e provocativo da mesma maneira como livros, esculturas, pinturas ou músicas também podem ser. Esse é um título essencial não apenas para quem gosta de skateboard, como para quem entende que videogames também podem ser considerados obras de arte quando são criativos, visualmente diferentes e/ou inovadores.

    Nossa nota

    4 / 5

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    Assista ao trailer:

    Ficha técnica de Skate Story

    Lançamento: 8 de dezembro de 2025

    Desenvolvido por: Sam Eng

    Publicado por: Devolver Digital

    Plataformas: PC, Nintendo Switch 2 e PlayStation 5

    Número de jogadores: 1

    Gêneros: Ação, Aventura, Esporte

    Idiomas: Português (Brasil), Inglês, Francês, Alemão, Espanhol (América Latina e Espanha), Japonês, Coreano, Russo, Chinês simplificado, Chinês tradicional

    Preço: R$ 44,90 (PC), R$ 59,99 (Nintendo Switch 2), R$ 114,90 (PlayStation 5). Disponível gratuitamente para assinantes do PlayStation Plus Extra.

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